domingo, 9 de outubro de 2016

Suéter


Queria te escrever só para dizer que hoje me vesti com aquele teu suéter vinho, aquele bem fofinho, aquele que talvez tu nem lembres que está comigo. Porque hoje fez frio e ele era a peça mais aconchegante do guarda roupa, não só por ser quentinho, mas é que teu cheiro ainda anda junto dele, o que me dá certa apreensão em usar pois tenho um sincero medo que ele se perca. Quiça você não saiba, mas teu odor impregnado nele me ajuda a acalmar. Sei que pode soar estranho, é que lembrei e resolvi vir aqui te contar. Te contar que o mundo parece melhor quando eu te sinto nele. Ele de fato é melhor. Então, era sobre teu cheiro, ou talvez sobre o suéter, mas acho que o que eu tinha pra te dizer mesmo era sobre você, ou sobre aquelas sensações que só você me faz ter.



Anna Valentina

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Minúcia



Relacionamento, definitivamente eu não estou falando de relacionamento. Não é sobre monogamia, união civil, alianças. Amor não tem nada a ver com isso. Eu falo de olhares que se dilatam. Dedos que se cruzam. Folículos ouriçados a partir do toque, do cheiro, do suspiro na nuca. Eu queria falar das contrações causadas pela presença, da lágrima derramada pela saudade, dos sorrisos espelhados pelos encontros. Talvez ainda precisemos entender as minúcias, aquelas que se revelam em olhares tímidos, em sorrisos abafados, em palavras subentendidas, em peles que se atritam receosas. Às vezes o amor está na mais simplória das atitudes, naqueles pequenos interstícios de carinho que só hemos de lembrar quando nos faltar. E faz falta. 


Anna Valentina

segunda-feira, 11 de julho de 2016

Crua



Alguma coisa estava crua demais, sabe? Dentro de mim. Era demasiado prematuro para se sofrer e eu, ansiosamente, sofria. Queria demais e esse querer me engolia. Devia não aspirar tanto o que não posso tatear, porque essas expectativas que se criam ao acaso são como beber do próprio veneno, mas não se morre, não! A gente agoniza e agoniza e as horas que não passam e, todavia, ultrapassam qualquer raciocínio lógico. Somos levados a beira do abismo com os braços distendidos lá, onde há um misto de vontade de morrer e de viver. Onde nada há.


Anna Valentina

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Limite


Eu procuro razões mesmo sabendo que, lastimavelmente, muitas não se acham e outras têm o costume da cair em meio ao vão. Em vão. E é como estar sempre a espera do próximo vagão, algum que me leve a um destino brando, onde meus cansaços descansem e minha dúvidas se resignem. Mas estou no limite, que é onde me sento, onde me sinto, num constante limite de mim mesma.



Anna Valentina

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Desvairada


E desde então viu-se num drama, dos que despontam no gênero dramalhão. Foi de repente, amanheceu e tudo estava um breu. O que houve com a luz? Num determinado momento parou de se questionar. Paralelo aos contos de fada acolá está, a chuva cai dentro da casa e fora continua sereno, feito serenata em noite de luar. Maldito cinema matinê que faz acreditar em comédia romântica clichê, contudo, venho contar-lhes uma tragicomédia, daquelas que de tão trágica não poderia deixar de ser cômica. E quem não se deleita com boa risada? Nem que seja a custa da desgraça alheia. "Rir é o melhor remédio" e de tanto medicar-se, fez-se louca. Ah, quisera eu saber o fim. Loucura não tem fim. E se a morte guarda a eternidade, quem sou eu para saber da verdade, da moral dessa tragicomédia interpretada pelo exagero de uma desvairada que mente sobre felicidade?



Anna Valentina

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Entrelinhas



Há palavras e há silêncios e dentre as entrelinhas há palavras silenciosas e silêncios berrantes, e há sempre a impressão de que qualquer palavra de mais ou silêncio de menos, ou vice-versa, pode fazer todo o entendimento desandar.

Anna Valentina